cannabis para insonia
Tempo de leitura: 7 minutos

Será que a cannabis funciona para insônia virou um dos temas mais quentes nas conversas entre pacientes e profissionais da saúde. Mas o que a ciência de fato mostra sobre qualidade do sono? Neste guia didático — e direto ao ponto — reunimos evidências clínicas recentes (incluindo um ensaio controlado pragmático com milhares de participantes e uma meta-análise de RCTs) para explicar como canabinoides podem ajudar (ou não), quais limitações existem, efeitos adversos, diferenças entre formulações e boas práticas de prescrição responsável.

Spoiler: os dados mais robustos apontam melhoras pequenas em qualidade do sono no curto prazo, com efeitos colaterais previsíveis (como tontura) e incertezas quando comparamos canabinoides a tratamentos ativos padrão.

Introdução rápida: por que olhar para cannabis e sono?

Insônia e distúrbios do sono têm alta prevalência e impacto funcional relevante, que variam de piora cognitiva a acidentes e absenteísmo, o que explica o interesse por terapias complementares. A literatura clínica aponta aumento do uso de cannabis para “dormir melhor” ou cannabis para insônia, e diretrizes clássicas reforçam a importância de medidas validadas para avaliar desfechos de sono (ex.: PROMIS Sleep Disturbance, ISI).

O que mostram os grandes dados recentes (ensaio pragmático com canabinoides, melatonina e sono)

Um estudo de efetividade do tipo randomizado e controlado (pragmático), conhecido como Radicle Discovery Sleep, comparou diferentes formulações contendo CBD (isolado e combinações) com melatonina (isolada e em combinação). Em poucas semanas, todos os braços melhoraram significativamente o escore PROMIS Sleep Disturbance 8a em relação à linha de base (p < 0,0001), e houve diferenças discretas entre braços — com tendência de maior redução do distúrbio de sono no grupo melatonina + CBD versus CBD 15 mg isolado (coef. −0,4; IC95% −0,8 a 0,0; p = 0,059).

Na análise item-a-item do PROMIS, melatonina + CBD se saiu melhor em “meu sono foi reparador”, “tive problema com meu sono” e “meu sono foi inquieto”, com diferenças pequenas, porém estatisticamente significativas em duas dessas questões; não houve diferença nos itens “qualidade do sono”, “dificuldade para dormir”, “tentei muito pegar no sono”, “preocupação por não conseguir dormir” e “satisfação com o sono”.

De olho nos desfechos clinicamente importantes: cerca de 67% dos participantes alcançaram MCID (mínima diferença clinicamente importante) na pontuação de distúrbio do sono em todos os braços, com porcentagens variando de ~56% a 75% conforme a formulação; ainda assim, não houve diferença significativa entre as formulações CBD sem melatonina e entre as com melatonina.

Como era um estudo pragmático com titulação livre, a ingestão diária de cápsulas aumentou em todos os grupos ao longo do acompanhamento — algo esperado em cenários de efetividade do “mundo real”.

Tradução prática: em cenário realista, melatonina (sozinha ou combinada) continua sendo um comparador forte para queixa de sono; CBD (isolado ou em combinações sem melatonina) também se associa a melhora dentro do período de seguimento curto, mas sem superioridade consistente entre as formulações.

Se você ainda não sabe a diferença entre o CBD isolado e as formulações full spectrum e broad spectrum, consulte nosso guia completo sobre o assunto!

O que diz a evidência agrupada (meta-análise de RCTs): tamanho de efeito, eventos adversos e limites

Uma meta-análise abrangendo 39 ensaios clínicos randomizados avaliou efeitos de cannabis/canabinoides sobre sono (em grande parte, pacientes com dor crônica) e insônia e encontrou que, comparados ao placebo, os canabinoides geram um melhora pequena em qualidade do sono e distúrbio do sono — com efeitos maiores em dor crônica não oncológica e menores em dor oncológica.

O estudo traduz os efeitos em Risco Absoluto (Risk Difference) e números fáceis: algo como 1 em cada 13 pacientes relata melhora de qualidade do sono; em distúrbio do sono, o ganho é mais visível em dor não oncológica. Por outro lado, há aumento do risco de tontura (especialmente em tratamentos ≥ 3 meses, RD ~29%), além de sonolência, boca seca, fadiga e náuseas (RD ~6–10%). Em resumo, um benefício pequeno e importante e com efeitos colaterais previsíveis.

Inclusive, a canabis tem sido usada para diferentes condições médicas em que os distúrbios do sono são uma consequência, como é o caso da enxaqueca, nesse estudo analisado pela equipe do Kaya Doc, os pesquisadores encontraram evidências positivas do uso de CBD e THC em pacientes com enxaqueca.

Comparações vs. tratamentos ativos (ex.: amitriptilina, opioides, diazepam) são incertas (baixa a muito baixa certeza) — há sinais de que a nabilona possivelmente é melhor que a amitriptilina para sintomas de insônia em fibromialgia, mas isso se baseia em um único RCT pequeno; versus dihidrocodeína, diferença nula para interrupções do sono.

Pontos críticos da meta-análise: janela de 2 a 16 semanas, predomínio de formas não inaladas e titragem pós-randomização em 72% dos ensaios — tudo isso limita a generalização dos achados e a inferência de dose-resposta.

O que esperar no longo prazo? A própria síntese destaca que a evidência disponível não permite conclusões firmes do uso da cannabis para insônia; há estudos observacionais sugerindo melhora no curto prazo, mas piora na iniciação e manutenção do sono com uso prolongado.

Panorama da literatura especializada: revisões narrativas e lacunas

Revisões da literatura sobre cannabis, canabinoides e sono organizam o campo, mostrando resultados heterogêneos conforme quadro clínico, tipo de canabinoide (THC, CBD, nabilona, nabiximols), via e tempo de uso. Em comum, a mensagem de que os sinais de benefício tendem a surgir no curto prazo, enquanto tolerância e alterações de arquitetura do sono com THC merecem cautela e investigação adicional — especialmente quando saímos do contexto de dor crônica.

Formulações, espectro e combinações: o que muda para o paciente com insônia?

  • CBD isolado x combinações: no estudo pragmático, combinações com melatonina tenderam a melhor performance em itens específicos do PROMIS, mas não houve superioridade consistente entre formulações CBD sem melatonina, e 67% atingiram MCID no conjunto. Isso reforça que rotas com foco em higiene do sono + adjuvantes (melatonina quando indicado) podem ser úteis; CBD pode somar, mas não “substitui” o básico.
  • THC e análogos (ex.: nabilona): podem reduzir latência de início do sono em alguns contextos de dor, porém com efeitos adversos (tontura, sonolência) e incerteza frente a comparadores ativos. Em especial, tontura cresce com uso mais prolongado.
  • Nabiximols (THC:CBD oromucosal): apresentam resultados mistos em dor e sintomas relacionados; para sono, o efeito global na meta-análise se mantém pequeno vs. placebo.

Se a sua preocupação é os efeitos dos canabinoides no seu paciente, nesse artigo nós exploramos os principais efeitos do CBD e do THC no corpo humano. Agora, se você não sabe quais são os principais produtos utilizados por médicos prescritores no país, confira nosso artigo completo sobre marcas e formulações mais comuns de canabidiol no país.  

Segurança: o que observar no consultório

No agregado, espere pequenos ganhos de sono com probabilidade de eventos adversos leves/moderados. O aumento de tontura é o sinal mais consistente (e aumenta com a duração); sonolência diurna, boca seca, fadiga e náusea aparecem com frequência moderada.

Monitore, em especial, os pacientes idosos, polimedicados e aqueles com apneia do sono (onde dados de dronabinol ainda são limitados e não extrapoláveis para óleos artesanais).

Boas práticas clínicas: como decidir, como começar, como acompanhar

  1. Indicação criteriosa
    No uso da cannabis, priorize pacientes com insônia comórbida a dor crônica (onde os dados são mais consistentes) e que falharam ou não toleraram medidas de 1ª linha (higiene do sono, TCC-I, otimização de melatonina quando indicada). Combinações com melatonina podem ser avaliadas na prática, mas evidências de superioridade robusta das diferentes formulações de CBD entre si não foram demonstradas.  
  2. Escolha da formulação
  • CBD isolado ou produtos broad-spectrum: perfil de segurança favorável; efeitos de sono modestos.
  • Alto THC: avaliar risco-benefício, principalmente em idosos e trabalhadores que exigem estado de alerta.
  • Produtos balanceados (CBD:THC): considerar custo e regulação; evidência de sono pequena vs. placebo.
  1. Doses e titulação
    Comece baixo e aumente devagar, alinhado à lógica do estudo pragmático (em que a ingestão média por dia subiu ao longo das semanas). Reavalie 2–4 semanas depois, usando medidas padronizadas (PROMIS, ISI). Se não houver resposta clinicamente relevante, descontinue a cannabis para insônia.
  2. Horizonte temporal
    Evidência controlada foca no curto prazo (2–16 semanas). Cuidado ao manter uso contínuo sem reavaliação: a literatura indica incerteza e até piora de início/manutenção do sono com uso prolongado. Planeje “drug holidays” ou estratégias de desmame quando fizer sentido.
  3. Eventos adversos e interações
    Eduque sobre tontura e sonolência (evitar dirigir após dose noturna, por exemplo) e monitore possíveis interações (CYPs) conforme a medicação de base. Acompanhe pressão arterial, sonolência diurna e função cognitiva em populações de risco.

Ainda em dúvida sobre o uso da cannabis em seu paciente, veja esse artigo e se ela é a melhor opção para ele!

O papel do Kaya Doc para prescritores (médicos, dentistas e veterinários)

Se você prescreve para sono/insônia, o Kaya Doc ajuda a tomar decisão com segurança e eficiência:

  • COA (Certificate of Analysis) na mão: confira pureza, perfil de canabinoides e contaminantes antes de escolher a marca e a concentração.
  • Comparação de preços e apresentações: enxergue rapidamente custo por mg, volumes e veículos para facilitar adesão.
  • Prescrição digital orientada: gere receitas compatíveis com o arcabouço regulatório, com campos padronizados, posologia e alertas úteis.
  • Follow-up estruturado: monitore PROMIS/ISI no tempo para documentar MCID e guiar manutenção ou descontinuação.

Na prática, é o caminho mais curto entre evidência, produto correto e prescrição segura — especialmente quando você precisa comparar CBD isolado vs. combinações e avaliar melatonina como coadjuvante, como visto no estudo pragmático. Cadastre-se gratuitamente agora!

Perguntas frequentes rápidas

1) “CBD ou cannabis funciona para todo mundo com insônia?”
Não. As médias populacionais mostram ganhos pequenos, e a resposta individual varia; cerca de 1 em 13 pacientes relata melhora de qualidade do sono vs. placebo em RCTs, e 67% atingiram MCID no ensaio pragmático ao combinar/ajustar formulações (incluindo melatonina).

2) “THC ajuda a pegar no sono?”
Pode reduzir latência em alguns cenários, mas com tontura e sonolência mais frequentes; efeitos de longo prazo e comparações com terapias padrão ainda são incertos.

3) “E no longo prazo?”
A evidência controlada não sustenta conclusões firmes; estudos observacionais sugerem melhora curta e piora com uso prolongado para iniciar e manter o sono — reforçando a importância de reavaliar.

Conclusões práticas

  • Sim, os canabinoides podem ajudar um pouco na qualidade do sono, sobretudo quando a dor é parte da equação — efeito pequeno, porém clinicamente percebido por uma parcela dos pacientes.
  • Cuidado com tontura, sonolência e outras reações; avaliação de risco é essencial, principalmente em idosos.
  • Melatonina segue relevante e, em estudo pragmático, itens do PROMIS favoreceram melatonina + CBD versus CBD 15 mg isolado — mas sem diferença global consistente entre formulações sem melatonina, e MCID ocorreu em cerca de 2/3 dos participantes.
  • Longo prazo ainda é um ponto de interrogação. Reavalie periodicamente e privilegie medidas não farmacológicas de sono como base do tratamento.

Referências essenciais usadas na revisão

  • Meta-análise de RCTs (Sleep, 2022): melhora pequena vs. placebo; tontura é o AE mais proeminente; incerteza vs. tratamentos ativos; foco em 2–16 semanas e não inalados.
  • Ensaio pragmático (J Am Nutr Assoc, 2023): PROMIS melhorou em todos os braços; tendência pró melatonina+CBD em alguns itens; 67% atingiram MCID; sem diferenças entre CBD sem melatonina.
  • Revisão de literatura (Current Psychiatry Reports): contextualiza heterogeneidade e levanta lacunas (populações, vias, tempo de uso).

Este conteúdo é educativo e não substitui avaliação clínica individualizada. Em caso de prescrição, siga a regulamentação vigente, monitore desfechos e documente o racional terapêutico.

Posts que você pode gostar

0 0 votos
Classificação do artigo
Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários